Dividido, Adão aprende a fingir e a fugir. De Deus. De Eva. E depois, como ele, foge Caim de Abel, seu irmão. E aí por diante, numa espiral infernal de desconfiança e ressentimento, num mundo que se torna hostil. Entre tantos desencontros e desentendimentos, come-se o pão amassado com grande custo e dá-se à luz em grande dor. E nós aprendemos pela mesma cartilha. Fugimos e fingimos. Negamos a realidade. Lamentamos o limite. Tememos a diferença. Baixamos o olhar. Tapamos o ouvido. Evitamos o contacto. Viciamos o paladar. Iludimos o encontro. Tememos a exposição. Diante de ti, porque não sei estar à altura de mim, vou além ou fico aquém do que sou, levanto a voz ou emudeço, empertigo-me ou apago-me. Não sou capaz de ser só e tudo o que sou. E, assim, faz-me mal que tu sejas diferente e que possas ser quem és.
Mas eis que neste jogo tenso de atração e de distanciamento, uma voz grave se impõe. Interpela, de novo, pelo nome, trazendo de regresso, ao próprio lugar. Só terei de ser o que sou, nem mais nem menos. E só poderei avançar se partir do lugar onde me encontro. - Mas tu, onde estás? E onde está o teu irmão? Con-vocado, in-vocado, pro-vocado, não poderei não apresentar-me diante desta voz. Não poderei não co-responder. Mesmo o silêncio ou a fuga já seriam resposta.
José Frazão Correia, sj
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