Quantas vezes não teriam aquelas pedras suportado o mesmo andar pesado, como quem em cada passada contesta o mundo. Todos os dias percorria aquele caminho. A quem escapasse a dureza das passadas, não passaria ao lado o rosto marcado por rugas cultivadas antes do tempo. Um rosto que todos os dias servia de moldura a uma expressão que em bom português se definiria como “mal encarada”. Rua acima, rua abaixo, havia sempre motivo para mal dizer, a roupa de um, a atitude de outro, o tempo, a crise…O mundo parecia conspirar atenciosamente para que nada, nunca, fosse digno de um sorriso.
O modo como olhamos o mundo que nos rodeia, a nossa circunstância, o estado de espírito e claro, os traços de personalidade, influenciam aquilo de que falamos, o que dizemos, como dizemos. Mas nós mesmos, o nosso olhar, o nosso estado de espírito e claro, os nossos traços de personalidade, também influenciamos o mundo à nossa volta. Aqueles com quem nos cruzamos, os projectos em que investimos, os círculos em que nos movemos. Tudo aquilo em que estamos é condicionado pela nossa presença e o que ela transmite. E transmite sempre alguma coisa, é axiomático, “não podemos não comunicar”1. Mas qual será o critério que usamos para aquilo que comunicamos, seja para o que dizemos por palavras, pelo que a nossa expressão traduz, pelos nossos gestos… É centrado em mim, nas minhas necessidades, no meu umbigo ou passa por um ideal altruísta, pelo outro, pelo crescimento da relação? Os valores, aquilo em que acreditamos deveriam orientar o nosso modo de proceder nas coisas mais básicas, creio que a esta verdade se reduz a dificuldade e simplicidade da coerência. Se em alturas chave do meu dia, alguém me sussurrasse ao ouvido: “a boca fala da abundância do coração”2 passaria a medir de outra forma os meus gestos? De tanto mal dizer perdera a capacidade de calar, de dizer bem, de escutar. Certo dia, rua acima, rua abaixo, alguém lhe teceu um elogio, curto, simples, gratuito. Por momentos, corou. 1 Paul Watzlawick 2 Mt 12, 34 | |
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Nos Evangelhos Sinóticos, lemos muito sobre as pregações de Jesus a propósito do «maior mandamento». Não é a grande sugestão, o grande conselho, a grande linha diretiva, mas um mandamento. Primeiro, temos de amar a Deus com todo o coração e com toda a nossa força, sobre todas as coisas. Ao trabalhar com os pobres camponeses da América Central, que não sabiam ler nem escrever, a frase que eu sempre ouvia era: «Primero, Dios». Deus tem de ser o primeiro nas nossas vidas, depois, todas as nossas prioridades estão corretamente ordenadas. Não amaremos menos as pessoas, mas mais, por amar a Deus. A segunda parte do «maior mandamento» é amarmos o próximo como a nós mesmos. E Jesus ensina-nos, na parábola do Bom Samaritano, que o nosso próximo é esse estrangeiro, esse homem ferido, essa pessoa esquecida, aquele que sofre e, por isso, tem um direito acrescido sobre o meu amor. Jesus manda-nos amar os estranhos. Se só saudamos os nossos, não fazemos mais do que os pagãos e os não cr
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